A aquisição da merenda escolar deve contemplar a produção dos povos tradicionais de 18 municípios da 2ª Região Agrária do Pará
A Promotoria de Justiça Agrária da 2ª Região, que tem sede em Santarém, expediu Recomendação no último dia 25 de novembro, aos prefeitos e secretários municipais de Educação dos 18 municípios de sua área de abrangência, para que cumpram a obrigatoriedade mínima de que 30% da alimentação escolar seja proveniente da agricultura familiar, e efetuem chamada pública que contemple os povos tradicionais, entre outras medidas.
A Recomendação da promotora de Justiça Herena Melo foi destinada aos municípios de Almeirim, Alenquer, Aveiro, Belterra, Curuá, Faro, Itaituba, Jacareacanga, Juruti, Mojui dos Campos, Monte Alegre, Novo Progresso, Óbidos, Oriximiná, Prainha, Rurópolis, Santarém, Terra Santa e Trairão. O documento foi apresentado no dia 23 de novembro em reunião ampliada da Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos (Catrapovos Pará), que reuniu gestores, nutricionistas, agricultores familiares e povos de comunidades tradicionais. A Catrapovos é uma mesa de diálogos coordenada em todo o Pará para a implementação com resolutividade do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
A Mesa de Diálogo Permanente Catrapovos Brasil foi criada neste ano pela 6ª CCR (câmara temática para populações tradicionais) do Ministério Público Federal (MPF), expandindo a iniciativa pioneira do Estado do Amazonas para vários estados, inclusive o Pará, onde foi instituída nos termos da Portaria n.1809/2020- MPPA/PGJ. Deve reunir periodicamente com órgãos municipais, estaduais, federais, sociedade civil, lideranças e movimento indígena e de comunidades tradicionais para debater medidas e implementação de políticas públicas que garantam a efetiva aplicação da Lei nº 11.947/2009 e de alimentação escolar tradicionalmente adequada a estes povos.
O grupo também articulou junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) a expedição da Nota Técnica n°09/2021/SAF/MAPA, indicando que a ausência temporária de identificação específica de comunidades tradicionais, com exceção dos quilombolas e indígenas já contemplados, nos cadastros e políticas públicas, como Censo Escolar, Declaração de Aptidão ao Pronaf e o Cadastro Nacional da Agricultura Familiar, não pode ser barreira para acesso às compras públicas, e pode ser suprida por outros documentos reconhecidos pelo Poder Público que identifiquem o agricultor familiar e a escola/comunidade como pertencente aos povos e comunidades tradicionais existentes no Brasil.
Em 2020 foi lançado ainda o guia “Alimentação escolar indígena e de comunidades tradicionais no Amazonas” da Série “Agricultura familiar: boas práticas replicáveis de comercialização de produtos da sociobiodiversidade e agroecologia, produzido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em parceria com o projeto Mercados Verdes e Consumo Sustentável da GIZ, e elaborado em conjunto com o MPF/AM e FNDE.
No Brasil, a oferta de refeições deve atender às necessidades nutricionais dos estudantes durante o período letivo. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE, no mínimo 30% deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas.
O MPPA destaca que muitos municípios sequer atingiram o patamar de compra dos 30%, e que o descumprimento de determinações legais pode acarretar na responsabilização do gestor executivo do município ou Estado, inclusive por improbidade administrativa. As justificativas usadas frequentemente por alguns gestores para não realizar a compra dos produtos tradicionais seria a “ausência de produção” entre povos indígenas e tradicionais, “o que não é verdadeiro e apenas demonstra desconhecimento do gestor em relação à realidade dos cidadãos de seu município, uma vez que produção pode ser tanto proveniente de plantação quanto de produtos extraídos da floresta”, ressalta a Recomendação.
A Promotoria de Justiça Agrária da 2ª Região recomenda aos gestores dos 18 municípios que cumpram a obrigatoriedade mínima de compra de 30% de alimentos da alimentação escolar proveniente da agricultura familiar, em 2021 e nos anos seguintes, nos termos da Lei 11.947/2009, com a priorização de compra da produção de assentados da reforma agrária, povos tradicionais indígenas e quilombolas.
E que façam chamada pública diferenciada contemplando os povos tradicionais, de modo a garantir o respeito à alimentação culturalmente adequada nas escolas indígenas e tradicionais em geral, nos termos das Notas Técnicas nº NT nº 3/2020/6ªCCR/MPF e NT n° 09/2021/SAF/MAPA. Devem informar o exato cronograma de lançamento e o andamento da chamada pública estadual para esses povos, com ajustes construídos junto à sociedade civil e demais órgãos públicos. E assegurar, em caso de suspensão das atividades educativas presenciais devido à pandemia ou estado de calamidade pública, a distribuição dos alimentos e continuidade do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), destinando-os aos alunos da rede de ensino que deles necessitarem, conforme a realidade, economia e produção local.
O não atendimento da Recomendação ensejará na responsabilização dos destinatários e dirigentes, sujeitando-os às medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis. No prazo de 30 dias a partir do recebimento, devem prestar informações à Promotoria de Justiça Agrária de Santarém, encaminhando relatório com datas, cronograma e meios para seu cumprimento.
Comunicação MPPA