Juízo de primeira instância havia determinado, em substituição a estudos contratados pelo CIF, adoção de uma metodologia que é contestada pelo próprio Ministério da Saúde
O Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DPE-MG) e a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPE-ES) obtiveram junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) uma liminar que suspendeu decisões de primeira instância e determinou a continuidade do processo de reparação dos atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão, a partir dos estudos para avaliação de risco à saúde humana realizados pela AMBIOS e pelo Grupo EPA Engenharia e Proteção Ambiental.
A liminar foi concedida em Agravo de Instrumento interposto pelo MPF e Defensorias Públicas contra decisões proferidas pelo Juízo da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte (MG).
O magistrado havia determinado a implementação e execução de uma metodologia denominada “Gestão Ambiental Integrada para Saúde e Meio Ambiente (GAISMA)”. Porém, a GAISMA não cumpre as Diretrizes para Realização de Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana por Exposição a Contaminantes Químicos que foram estabelecidas pelo Ministério da Saúde, por meio do Departamento de Saúde Ambiental, do Trabalhador e Vigilância das Emergências em Saúde Pública.
As empresas Samarco Mineração S/A, Vale S/A e BHP Billiton Brasil Ltda, bem como a Fundação Renova (entidade que criaram para realizar a reparação dos danos), defendiam o emprego da metodologia GAISMA para a realização de tais estudos.
GAISMA Aprimorada – Em uma das decisões que foram objeto do recurso do MPF e das Defensorias Públicas, o Juízo da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte determinou que a GAISMA deveria ser aprimorada e utilizada como metodologia para a avaliação dos riscos.
MPF e Defensorias Públicas manifestaram-se de maneira contrária à adoção da GAISMA, mesmo que em versão “aprimorada”, uma vez que tal metodologia tenta integrar estudos que dizem respeito à saúde e ao meio ambiente, mas a avaliação de riscos à saúde humana, segundo diretrizes do Ministério da Saúde, deve adotar o critério do denominado “pior cenário existente”.
O Ministério da Saúde, inclusive, já havia proferido parecer contrário à utilização da GAISMA.
A mesma proposta já havia sido apresentada pela Fundação Renova ao Comitê Interfederativo (CIF), que é uma instância deliberativa criada, mediante acordo realizado, em março de 2016, entre a União, o Estado de Minas Gerais, o Estado do Espírito Santo e as empresas, para coordenar o processo de reparação. Ela foi rejeitada pela Câmara Técnica Saúde (CT-Saúde) do CIF.
A decisão da Desembargadora Federal observa que, “ao se permitir às empresas rés a revisão técnica de aprimoramento da GAISMA, pontuando que as empresas poderão, a seu livre critério, deixar de incorporar os aprimoramentos e aperfeiçoamentos condicionados pelo CIF na Deliberação no 374/2020, há uma flexibilizaço que destoa da necessidade de atender às indicações do órgão encarregado de direcionar o processo de reparação, invertendo valores ao deixar ao encargo das empresas a definição sobre a submissão da GAISMA aos aprimoramentos recomendados não só pelo CIF, embasado em sua Câmara Técnica, como também do Ministério da Saúde.”
A liminar ainda garantiu que, em caso de futura adoção de uma versão aprimorada da metodologia GAISMA, ela deverá ser previamente adequada aos “contornos definidos pelo Ministério da Saúde e pela CT-Saúde (integrante do CIF), e desde que essa opção se mostre a mais adequada e eficaz para a condução dos trabalhos, tudo condicionado ao contraditório”.
Outros estudos – Com relação a outros estudos de avaliação de riscos que já haviam sido realizados, a decisão do TRF-1 suspende a decisão agravada e determina “a continuidade do processo de reparação com respaldo nos estudos anteriormente elaborados pela AMBIOS e pelo Grupo EPA Engenharia e Proteção Ambiental para avaliação de risco à saúde humana, cujas linhas de estudos deverão ser retomadas pela Fundação Renova, tendo em vista ser essa a metodologia chancelada pelo Ministério da Saúde”.
Para o MPF, DPU, DPE-MG e DPE-ES, “não há como serem invalidados estudos já realizados, pois eles constituem instrumentos de conhecimento da realidade. Considerando que tais estudos seguiram as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde, poderiam, em tese, ser até mesmo contrastados por outros estudos que também observassem tais diretrizes obrigatórias, mas do ponto de vista lógico não poderiam ser considerados inválidos. Até mesmo porque construir uma nova metodologia, diferente daquela já chancelada pelo Ministério da Saúde, dependerá de mais tempo e acarretará novos atrasos em um processo de reparação que já tem se revelado demasiadamente demorado.”
A decisão liminar lembra que a questão, de natureza extremamente técnica, foi amplamente debatida pelos órgãos competentes, com a fixação de diretrizes que não podem ser ignoradas pelo Judiciário, sob pena de as decisões não refletirem “avanço no processo de reparação dos atingidos pelo acidente em Mariana, especificamente naquele tema abordado no Eixo Temático Prioritário 2, que versa sobre os Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico”.
Os estudos já realizados, em especial o “Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana” elaborado pela empresa AMBIOS, e o “Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana, área piloto de Barra Longa-MG” conduzido pelo Grupo EPA, que apontaram “situação de perigo urgente para a saúde pública”, haviam sido invalidados pelo Juízo da 12ª Vara Federal.
O TRF-1, porém, lembrou que a decisão de primeira instância não apresentou “justificação suficiente para que se possa compreender a adequação” dessa determinação (…), “carecendo de motivação o pronunciamento judicial”.
A decisão do TRF-1 também registra que os estudos de avaliação de risco à saúde humana sequer foram concluídos pela empresa AMBIOS, consoante informações trazidas pelos agravantes, segundo os quais apenas a Fase I foi realizada, noticiando que a “descontinuação de tais estudos nas fases subsequentes (Fase 2 e Fase 3, sequer iniciadas) aponta um caminho que prestigia a vontade do poluidor-pagador, ou seja, das empresas Samarco, Vale e BHP, que constituíram a Fundação Renova. Ora, como a Fundação Renova já vinha se manifestando no sentido da descontinuação do referido estudo de avaliação de risco à saúde humana, invertem-se os mecanismos de reparação, deixando que as empresas agravadas, responsáveis pelo desastre do rompimento da barragem de Fundão, direcionem os rumos, a extensão e os limites da reparação.”
Clique aqui para ter acesso à íntegra da decisão do TRF-1.
Clique aqui para ler a íntegra do recurso do MPF, da DPU, da DPE-MG e da DPE-ES.
Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal em Minas Gerais