MPF apontou indícios de várias irregularidades no licenciamento do empreendimento Quinta da Villa Residence
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) de Santarém (PA) informou ao Ministério Público Federal (MPF), na última sexta-feira (29), que acatou recomendação do MPF e suspendeu as licenças ambientais concedidas para a construção do condomínio de luxo Quinta da Villa Residence, na Área de Proteção Ambiental (APA) de Alter do Chão.
Na resposta ao MPF, a Semma informou que realizou uma sindicância interna e suspendeu as licenças ambientais concedidas ao empreendimento. O órgão afirmou que a decisão foi tomada devido ao descumprimento de condições obrigatórias impostas pelas licenças, constatado pela equipe de fiscalização da secretaria.
Entre as irregularidades citadas pela Semma, está uma das várias apontadas pelo MPF: a destruição de área de preservação permanente (APP) fora das hipóteses legais. A secretaria também citou, como motivos para a suspensão das licenças, que no local houve desmatamento a corte raso realizado com máquina pesada e que o local não estava devidamente identificado, como estabelecem as licenças.
A secretaria informou ao MPF que determinou a reanálise integral do procedimento de licenciamento do empreendimento.
Propostas do Conselho Gestor – A Semma enviou ao MPF, ainda, memorando interno em que a Divisão de Gestão de Unidades de Conservação, da Secretaria, registra decisões tomadas pelo Conselho Gestor da APA Alter do Chão durante reunião realizada na última quinta-feira.
O documento cita propostas do conselho para a APA, focadas em limitar o gabarito de construções; limitar área de implantação de condomínios e loteamentos; aumentar o percentual de área verde mínima em empreendimentos de parcelamento do solo; implementar em lei a regulação da consulta prévia ao Conselho Gestor e torná-lo de natureza deliberativa, estabelecendo as atividades com respectivos portes que seriam obrigadas a passar pelo conselho; estabelecer critérios diferenciados para análise de grandes empreendimentos; e estabelecer, em lei, prazo para a formalização do Plano Gestor da APA de Alter do Chão.
Além disso, o documento registra que foi prevista a apresentação da proposta do plano emergencial da APA, que focará no planejamento da unidade e contemplará o zoneamento e programas emergenciais para Alter do Chão. Esse plano emergencial será construído pela Semma e pelo Conselho Gestor da APA, registra o memorando. O documento cita, ainda, que foi programada, para esta terça-feira (3), na vila de Alter do Chão, reunião de apresentação das propostas de alterações para a APA.
“O MPF esclarece, desde logo, que a consulta ao Conselho Gestor não substitui o direito de consulta prévia, livre e informada ao povo indígena e aos extrativistas da região”, destaca o procurador da República Vítor Vieira Alves, autor da recomendação. Ele também ressalta que o plano de manejo da APA não precisa ser formalizado em lei.
Entenda o caso – A decisão da Semma foi tomada após o MPF identificar uma série de irregularidades no processo de licenciamento, incluindo a suspeita de conflito de interesses envolvendo a empresa construtora e autoridades da prefeitura.
A obra, que já havia sido embargada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), está localizada em um terreno onde funcionava a Escola da Floresta, um espaço de educação ambiental com valorização da diversidade biológica e do conhecimento tradicional de povos indígenas e comunidades extrativistas.
O local também é considerado sagrado pelo povo indígena Borari, que alega não ter sido consultado sobre o empreendimento, ferindo o direito à consulta livre, prévia e informada.
Durante inspeção realizada no local, o MPF constatou o desmatamento de floresta nativa sem autorização, destruição de APP e risco de poluição de cursos d’água da região. A vistoria também apontou evidências de que o solo e subsolo abrigam, total ou parcialmente, sítio arqueológico, tendo sido identificada a presença de terra preta, que geralmente caracteriza manejo da terra por populações que viviam na região há milênios.
Além disso, há evidências de que o terreno, cuja posse anterior era do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS), seja terra pública, e não propriedade privada, como alegado pelos empreendedores.
A investigação do MPF aponta, ainda, para um possível conflito de interesses envolvendo a empresa construtora, Machado Lima Empreendimentos, e autoridades da Prefeitura de Santarém. O sócio da empresa, José Maria Ferreira Lima, é irmão do secretário municipal de governo e parente do atual prefeito. Ele também é advogado e já atuou como procurador-geral do Município. Seu escritório de advocacia já teve, como sócia-administradora, a atual procuradora-geral do Município, Paula Danielle Teixeira Lima Piazza, e funciona no mesmo imóvel da sede da construtora.
Pacote de medidas – A recomendação faz parte de um conjunto de medidas do MPF para proteger o meio ambiente e o povo indígena Borari em Alter do Chão. A suspensão das licenças visa garantir a proteção do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos direitos dos povos indígenas,
O MPF seguirá apurando o caso por meio de inquérito civil para confirmar os indícios das irregularidades fundiárias e buscar a reparação do dano ambiental.
Ministério Público Federal no Pará
Assessoria de Comunicação