Em decisão de 39 páginas, Fischer apontou que o Tribunal de Justiça do Rio não chegou a examinar o pedido de liberdade e os laudos médicos de Queiroz, ou seja, o caso deveria ser resolvido primeiramente numa instância inferior, antes de chegar ao STJ
O ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), revogou nesta quinta-feira, 13, a prisão domiciliar do ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz e de sua mulher, Márcia Aguiar. A medida havia sido determinada pelo presidente do STJ, João Otávio de Noronha, no mês passado, durante o recesso do Judiciário, provocando críticas dentro do tribunal por beneficiar Márcia, até então uma foragida da Justiça. Com a nova decisão, Queiroz terá de voltar para a cadeia e Márcia vai cumprir o mandado de prisão preventiva em regime fechado.
Queiroz foi detido em 18 de junho na casa de Frederick Wassef, então advogado do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), em Atibaia (SP). O ex-assessor é suspeito de operar um esquema de ‘rachadinhas’ – apropriação de salários de funcionários – no antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). O nome de Queiroz veio à tona em dezembro de 2018, quando o Estadão revelou que ele fez movimentações financeiras ‘atípicas’.
Menos de um mês após Queiroz ser preso, Noronha aceitou, no dia 9 de julho, um pedido da defesa do ex-assessor. No habeas corpus, os advogados de Queiroz pediram a conversão da prisão preventiva em domiciliar. Como argumento, citaram o estado de saúde do ex-assessor e o contexto de pandemia, além de criticarem fundamentos da medida autorizada pela Justiça.
Na ocasião, Noronha estendeu a prisão domiciliar para Márcia, que estava foragida. “Por se presumir que sua presença ao lado dele (Queiroz) seja recomendável para lhe dispensar as atenções necessárias”, argumentou o presidente do STJ.
Na decisão, Fischer alegou questões processuais para derrubar a prisão domiciliar ao casal. No despacho, de 39 páginas, o ministro também apontou que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro não chegou a examinar o pedido de liberdade e os laudos médicos de Queiroz. Ou seja, o caso deveria ser resolvido primeiramente numa instância inferior, antes de chegar à Corte superior.
Plantão
Noronha foi o responsável por analisar o habeas corpus da defesa do ex-assessor de Flávio porque, como presidente do tribunal, é o responsável pelos recursos urgentes que chegam ao STJ no plantão do Judiciário. O relator do caso, no entanto, é Fischer, que havia passado por uma cirurgia no fim de julho e só voltou ao trabalho no tribunal na quarta-feira, 12.
Na semana passada, a defesa de Queiroz protocolou pedido para que a relatoria do processo fosse retirada das mãos do ministro Fischer. Pessoas próximas do presidente Jair Bolsonaro e que acompanham o processo avaliavam que a divulgação recente de cheques envolvendo Queiroz e a primeira-dama Michelle Bolsonaro reforçaria um eventual entendimento do ministro relator para revogar a prisão domiciliar e mandar Queiroz e Márcia para a prisão.
Noronha, como mostrou o Estadão, tem perfil governista: em decisões individuais, o presidente do STJ atendeu aos desejos da Presidência da República em 87,5% dos pedidos que chegaram ao tribunal.
A decisão de Fischer atende a pedido apresentado pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo o subprocurador-geral Roberto Luíz Oppermann Thomé, o retorno dos investigados à prisão é necessário para “resgatar a dignidade da função jurisdicional e o respeito devido às decisões prolatadas por juízos competentes e o bom nome e conceito da Justiça”.
Em sua solicitação, Thomé descreve Queiroz como “operador financeiro de organização criminosa com grande influência sobre milicianos no Estado do Rio de Janeiro” e diz que a ordem de prisão teve fundamentação adequada e atual. Além disso, o subprocurador-geral caracterizou a decisão de Noronha como desrespeitosa à jurisprudência que impede a “concessão de benesses a pessoas que se encontrem foragidas”.
A ordem para que o casal fosse detido preventivamente partiu do juiz Flávio Itabaiana, da 27.ª Vara Criminal da capital fluminense, responsável por determinar as diligências enquanto o inquérito sobre o suposto esquema de desvio de salários no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio correu na primeira instância. Os dois foram acusados pelo Ministério Público do Rio de tentar obstruir as investigações.
Em junho, a Justiça do Rio aceitou habeas corpus da defesa de Flávio para que o caso seja julgado pela segunda instância. Por 2 votos a 1, os desembargadores da 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ concordaram com o argumento de que Flávio tem foro especial. Procurado, o advogado Paulo Emílio Catta Preta, que representa Queiroz e sua mulher, não respondeu até a publicação deste texto.
Fonte: Estadão