A auditoria foi realizada no período de 02 a 06 de dezembro de 2019 e o relatório apontando os problemas e sugerindo providências foi divulgado em 10 de fevereiro deste ano.
Várias falhas operacionais e de logística, algumas graves, do Ministério Público do Pará foram constatadas durante correição realizada por determinação do corregedor nacional do Ministério Público nas unidades do órgão que atuam na área de segurança pública e lidam com crimes violentos letais intencionais, sistema prisional e controle externo da atividade policial, em Belém, Ananindeua, Marabá, Altamira e Marituba.
A auditoria foi realizada no período de 02 a 06 de dezembro de 2019 e o relatório apontando os problemas e sugerindo providências foi divulgado em 10 de fevereiro deste ano. O Ver-o-Fato teve acesso à íntegra do relatório (veja no final da matéria) e pediu esclarecimentos sobre o conteúdo do documento à Procuradoria Geral de também estabeleceu o contraditório.
De acordo com o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a partir da análise do Atlas da Violência de 2019, Belém foi destacada como a terceira capital com maior índice de homicídios do Brasil. Os municípios de Altamira, Marituba, Marabá e Ananindeua encontram-se entre os 100 mais violentos do país e a taxa de crescimento de mortes violentas intencionais no Pará de 2014 a 2017 foi de 19,3%.
Segundo o levantamento, o sistema prisional do estado encontra-se em situação de grave superlotação e inadequação das instalações. Como ápice da deterioração das unidades prisionais, em setembro de 2019 o Centro de Recuperação Regional de Altamira foi sede do maior número de assassinatos durante uma rebelião desde o caso do Carandiru.
A correição constatou falta de funcionalidade do sistema de gestão processual para os membros obterem informações dos inquéritos policiais em tramitação nas promotorias e no judiciário, além da falta de ferramentas para controlar os prazos de tramitação dos inquéritos policiais em situação de diligência que estão fora das promotorias.
Exemplos da falta de controle do cumprimento de prazos foram apontados na 1ª Promotoria de Justiça de Direitos Humanos, Controle Externo da Atividade Policial e Tribunal do Júri de Ananindeua. Um inquérito policial instaurado em 2006, somente foi remetido pela primeira vez à Promotoria em 2011. Encaminhado à delegacia de polícia para diligências em 21/03/2011, os autos só tornaram a ser enviados ao Ministério Público em 29/11/2019.
Em relação ao Sistema Integrado do Ministério Público (SIMP) foi observado que, apesar de toda a alimentação cotidiana das promotorias, ele não gera relatórios qualificativos por classes, de modo que as informações precisam ser buscadas manualmente. O atual sistema não tem compatibilidade com o anterior Sistema de Controle Processual (SCP), o que tem dificultado ainda mais o controle das ações penais e inquéritos.
Quanto às investigações, em Marabá, foram constatados 703 inquéritos policiais ativos há mais três anos com vista aberta há menos de 30 dias. O relatório revelou que 51 inquéritos estavam sem tramitação na delegacia há mais de 500 dias, e 29 há mais de 1.000 dias.
Ainda em Marabá, outros 232 inquéritos estavam sem tramitação na delegacia há mais de 500 dias; 195 inquéritos parados há mais de 1.000 dias e 144 há mais de 2.000 dias, sendo tais feitos somente os vinculados à 2ª Promotoria de Justiça, conforme informações prestadas pela 2ª Vara Criminal.
A correição constatou também que a ausência de tramitação direta dos inquéritos policiais, associada à falta de sistema que permita acompanhar os prazos de remessa e devolução, tem gerado situações de inexistência de controle do cumprimento dos prazos do Código de Processo Penal.
Acesso pelas Varas Criminais do TJ
As informações só foram obtidas pela corregedoria em razão do levantamento feito pelas varas criminais, já que o MPPA não tem acesso ao sistema do Tribunal de Justiça do Pará.
A correição averiguou ainda a existência de um procedimento de investigação criminal instaurado para apurar irregularidades no Instituto Médico Legal Renato Chaves, com mais de 187.119 documentos e 728 anexos, já tendo sido solicitado ao procurador-geral de justiça a criação de força-tarefa para atuação nesse procedimento, até o momento não atendida.
Houve ajuizamento de ação civil pública nº 080071412.2019.8.14.002, em trâmite na 3ª Vara Cível e Empresarial de Marabá, cuja finalidade é o aparelhamento do setor técnico de medicina legal e perícias de Marabá e foi constatada a existência de expressivo passivo pericial naquela cidade, o que resulta em atraso e ineficiência da atuação ministerial.
Segundo relato dos promotores de justiça de Ananindeua, a maioria dos homicídios ocorre em razão de disputa entre organizações criminosas. O comportamento não colaborativo das testemunhas, que comumente temem represálias, explica o elevado número de inquéritos sem autoria conhecida. Nesse cenário, há uma dependência ainda maior da prova pericial.
Também foi constatada a necessidade de melhoria das estruturas física e de atuação do GAECO, assegurando o intercâmbio interinstitucional de informações sobre segurança pública e o apoio operacional e logístico, de forma a viabilizar o efetivo acesso aos bancos de dados oficiais e a criação de banco de dados próprio.
A atuação conjunta do MPPA com o MPT em relação às graves condições laborais das equipes de segurança e técnicas, bem como de todo o quadro de funcionários que trabalham no Centro de Recuperação Agrícola Mariano Antunes (CRAMA) foi destacada pela auditoria.
Providências que devem ser tomadas
A corregedoria determinou ao procurador-geral do Ministério Público que no prazo de 120 dias adote providências administrativas para que o sistema de gestão processual passe a permitir aos membros obterem informações sobre inquéritos policiais vinculados às suas promotorias; a quantidade de inquéritos policiais novos distribuídos por mês e também o controle do tempo de permanência dos inquéritos policiais fora das promotorias de justiça.
E que o sistema permita aos promotores de justiça obterem informações sobre ações penais vinculadas às suas promotorias; o controle do tempo de permanência e tramitação de ações penais nas varas judiciais, com a respectiva capacitação de membros e servidores. E ainda que o sistema permita o controle sobre o cumprimento dos prazos em feitos com investigados presos em tramitação nas promotorias.
Outra determinação ao procurador-geral do MPPA foi a melhoria da estrutura do GAECO, com ampliação das instalações físicas, considerando o espaço inadequado para comportar membros e servidores à luz das normas do meio ambiente do trabalho.
Segundo a correição, as instalações físicas atuais do órgão não proporcionam segurança ao exercício da função e não dispõem de espaço adequado para membros e servidores, considerando, ainda, o insuficiente aparato tecnológico para realização das atividades e a necessidade de interlocução com outros órgãos para o eficaz combate a organizações criminosas.
As melhorias devem possibilitar a lotação de policiais militares; celebração de convênio de cooperação técnica entre o MPPA e a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Pará, envolvendo a Polícia Civil e o Centro de Perícias Cientificas Renato Chaves, para assegurar o intercâmbio de informações, apoio operacional e logístico, viabilizando o efetivo acesso a seus bancos de dados, às informações e aos conhecimentos produzidos decorrentes de temáticas no âmbito da inteligência de segurança pública.
Também devem proporcionar o acompanhamento sistemático das prioridades temáticas e seus reflexos na sociedade; permitir a efetiva cessão de policiais civis e peritos da área de informática forense para integrarem o GAECO; orientar ou subsidiar a atuação do MPPA no combate às organizações criminosas; assegurar o intercâmbio de informações, apoio operacional e logístico, viabilizando o acesso ao seu banco de dados, às informações e aos conhecimentos produzidos; e, ainda, realizar intercepções telefônicas e telemáticas no âmbito da inteligência penitenciária, permitindo o acompanhamento sistemático das prioridades e seus reflexos na sociedade.
Outras recomendações foram a formação de equipe própria de tecnologia da informação para o Núcleo de Tecnologia e Análise; adquirir parque computacional (hardware e software) capaz de suportar operações complexas envolvendo o cruzamento de grandes volumes de dados, com infraestrutura completa de rede.
E ainda que promova a readequação das atribuições das Promotorias de Justiça de Ananindeua no que tange às manifestações sobre cautelares relativas a inquéritos policiais na fase pré-processual, atualmente sob alçada das duas Promotorias do Júri, de forma que fiquem sob a responsabilidade dos promotores criminais com atribuição junto às varas para as quais essas medidas sejam distribuídas e, assim, seja possível otimizar a atuação ministerial em outras áreas; que as duas Promotorias Criminais de Marituba sejam ocupadas por promotores titulares, uma vez que os atuais são substitutos, lotados em outras comarcas, e foi registrado um histórico de alta rotatividade de membros, circunstância que prejudica o bom andamento e a continuidade da atuação ministerial.
Com a palavra, a Procuradoria Geral de Justiça (PGJ) e a Corregedoria Geral do MPPA
Procurada pelo Ver-o-Fato, a Procuradoria Geral de Justiça (PGJ) do MP presta esclarecimentos sobre o relatório da Corregedoria Nacional do CNMP. A Corregedoria-Geral do MP paraense também apresentou manifestação. Veja ambas, abaixo:
Procuradoria Geral
“Em relação às recomendações e determinações à Procuradoria-Geral de Justiça, feitas pela Corregedoria Nacional do Ministério Público no relatório da Correição Extraordinária, realizada no Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), foram adotadas todas as providências necessárias em atenção ao solicitado pelo órgão correicional.
O relatório foi encaminhado aos órgãos de execução (Promotorias de Justiça) do Ministério Público, para que tomem conhecimento e adotem as providências cabíveis de sua atribuição, bem como enviado aos departamentos administrativos internos da instituição, para que cada unidade providencie as adequações referentes a sua área (informática, obras e manutenção e outros), como a melhoria dos sistemas hoje utilizados e as adaptações na estrutura física dos prédios.
A Procuradoria-Geral de Justiça oficiou também aos órgãos do Sistema de Segurança do Pará, para sugerir a celebração de convênios ou termos de cooperação técnica com o MPPA e, ainda revisar outros em andamento, em atendimento às recomendações contidas no relatório.
Serão ainda realizados estudos, por determinação da Procuradoria-Geral, para o cumprimento de todas as recomendações referentes às mudanças de atribuições e criação de cargos nos órgãos de execução.
Quanto ao passivo de perícias, a Procuradoria-Geral de Justiça oficiou ao CPC Renato Chaves solicitando providências urgentes para solucionar o problema”.
Corregedoria-Geral do MPPA:
“A respeito do Relatório Conclusivo de Correição Extraordinária realizada pela Corregedoria Nacional do Ministério Público nas Promotorias de Justiça que atuam nas áreas de Segurança Pública, Crimes Violentos Letais Intencionais, Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional, este Órgão Correcional tem a esclarecer que, em relação às proposições que lhe são afetas no citado relatório, considerando a sua precípua missão institucional de orientar e fiscalizar a atividade de execução, está adotando todas as providências para dar cumprimento às determinações e recomendações exaradas pela Corregedoria Nacional, direcionadas a si e especialmente aos órgãos de execução.
Na oportunidade informamos que as Promotorias de Justiça citadas no relatório foram notificadas para adotarem as providências pertinentes, e eventuais providências adicionais que se fizerem necessárias poderão ser tomadas tanto por este Órgão Local, como pela Corregedoria Nacional”.
Veja o relatório completo da corregedoria nacional do MP aqui.
Fonte: Bacana News