Professor da Ufopa é acusado de racismo por aluna da universidade; o fato ocorreu em sala de aula

“Me senti ofendida, violada, atacada, e não só a mim, mas ao meu povo e a todos que ele ofendeu”. Nesta quarta, a Universidade emitiu nota oficial; leia, na íntegra
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Na manhã de terça-feira, 27 de setembro, nas dependências da Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA, a discente Arliene Pereira dos Santos, indígena do povo Arapiun, sofreu um episódio de racismo por parte de um professor da instituição. 

A estudante procurou o Tapajós de Fato e afirmou que o professor, que ministra a disciplina de Química Ambiental, proferiu palavras racistas, além de desmerecer a luta dos povos indígenas. O mesmo proferiu falácias como o uso de indígenas por Ong’s para atrair dinheiro e usou os termos “xexelentos” e “cabeludos”, em tom pejorativo, para se referir aos indígenas da etnia Arapiun.

Segundo as testemunhas presentes, os episódios de racismo, intolerância religiosa e LGBTfobia ocorreram “aleatoriamente” durante sua aula no turno matutino, onde o professor começou comentando uma experiência que ele teve no Arapiuns.

Ainda durante as ofensas, o professor declarou abertamente apoio ao candidato à presidência Jair Bolsonaro e, quando confrontado pela estudante, disse que não adiantaria denunciar à ouvidoria da universidade, pois não aconteceria nada.

Em nota enviada à ouvidoria da instituição, a estudante relata algumas das ofensas proferidas:

“Palavras tais como ‘os índios daqui são usados pelas Ong’ s para atrair dinheiro para a Amazônia’ disse que é só pegar dois pretos e dois índios e levar para as ruas para fazer manifestação. Fora outras coisas desnecessárias que ele falou. Usou palavras para se referir às pessoas do Arapiuns em tom de desprezo como ‘xexelentos’ e ‘cabeludos’. Declarou apoio ao candidato Bolsonaro e que, se eu denunciasse na ouvidoria, não lhe aconteceria nada”.

Segundo ela, o professor disse ainda ser favorável à tese do Marco Temporal, que defende que os povos indígenas só podem reivindicar as terras ocupadas desde 5 de outubro de 1988, que é uma das principais lutas dos povos indígenas atualmente.

“Muitos desses povos não estavam em seus territórios por terem sido retirados à força, muitos dizimados, massacrados e expulsos em nome do progresso e do tal desenvolvimento, no qual ele se referiu dizendo que nossos povos atrapalham esses projetos em nossos territórios”, afirma Aliene.

A estudante cobra posicionamento da instituição, e exige medidas efetivas e combativas a fim de que episódios como esse não voltem a acontecer em um ambiente tão plural como uma universidade no meio da Amazônia.

Para ela, é inconcebível um professor despreparado ministrar aulas em uma universidade pública que recebe os mais variados públicos.

Ainda em nota, Arliene pede que a Ufopa tome as devidas providências o quanto antes, e relata ainda como se sente com o ocorrido.

“Me senti ofendida, violada, atacada, e não só a mim, mas ao meu povo e a todos que ele ofendeu. E penso em desistir da disciplina que o mesmo ministra”.

Em entrevista ao Tapajós de Fato, Arliane acusa o professor de fugir do tema ao abordar assuntos que não lhe competem.

“Não é um assunto de química ambiental. Não tinha necessidade de ele abordar esse tema, já que não é da área dele”

O Tapajós de Fato também entrevistou outra aluna, que não quis se identificar por medo de represálias. Segundo ela, além das falas racistas, o professor cometeu ainda crimes de intolerância religiosa.

“Ele proferiu palavras ofensivas relacionadas aos povos quilombolas e indígenas e também em questão de religiões por conta de que algumas pessoas na sala são evangélicas”.

A aluna afirma ainda que o professor é contra cotas nas universidades e que prefere que os alunos paguem mensalidade para estudarem.

“Ele acha errado os indígenas entrarem (na universidade) como bolsistas e os quilombolas também. Ele disse que prefere que os alunos paguem a universidade”.

Na manhã desta quarta-feira (28) a Ufopa emitiu a seguinte nota sobre o caso:

Nota oficial sobre denúncia de racismo

A Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) informa que está apurando a denúncia de racismo formalizada por uma discente indígena na terça-feira, 27 de setembro.

A denúncia, protocolada na Ouvidoria da Instituição, foi imediatamente encaminhada à unidade competente para instauração de processo administrativo para apuração da conduta do docente citado. Caso seja apurada falta cometida pelo docente, serão aplicadas as medidas disciplinares cabíveis.

Ao mesmo tempo, a Pró-Reitoria de Gestão Estudantil (Proges) foi acionada a prestar acolhimento psicológico e social à estudante, e o Instituto de Ciências e Tecnologia das Águas (ICTA), unidade acadêmica à qual a estudante está vinculada, a tomar as providências necessárias para garantir a permanência da discente na disciplina e para evitar maiores prejuízos aos envolvidos enquanto a denúncia está em fase de apuração.

A Ufopa reforça ainda que atua em defesa dos direitos das populações indígenas, em especial o direito ao ensino superior público, gratuito e de qualidade, e que não concorda com nenhum tipo de postura atentatória à dignidade humana. A instituição está aberta para dialogar com a comunidade acadêmica, em especial os discentes indígenas, e demais entidades que atuam em prol dessas populações para estabelecer estratégias de combate ao racismo estrutural.

Santarém (PA), 28 de setembro de 2022.

ALDENIZE RUELA XAVIER
Reitora da Ufopa

Fonte: Tapajós de Fato