Aprovado no Senado na última quarta-feira (09), o PL agora depende apenas da sanção da Presidência da República para entrar em vigor em todo o país
O Projeto de Lei 1.095/2019, que prevê o aumento das penas para maus-tratos contra cães e gatos, deve gerar uma importante mudança no sentido de combater a sensação de impunidade contra esse tipo de crime. Pelo menos essa é a expectativa de organizações e entidades que atuam em prol da causa animal. Aprovado pelo Plenário do Senado durante votação remota realizada na última quarta-feira (09), o PL agora depende apenas da sanção da Presidência da República para entrar em vigor em todo o país.
INTERFERÊNCIA
Advogado animalista, Wellington Santos explica que, inicialmente, o Projeto de Lei se estendia a todos os animais domésticos, porém, por interferência da bancara ruralista em Brasília o projeto passou a abranger especificamente cães e gatos. De qualquer maneira, o PL vem alterar um artigo da atual Lei de Crimes Ambientais, nº 9.605/98. “Em seu artigo 32, a atual Lei de Crimes Ambientais prevê aplicação de pena de detenção de três meses a um ano. Em razão desse prazo, obrigatoriamente a pessoa que cometia esse crime não podia ser presa e a pena dela teria que ser convertida em transação penal, para o pagamento de cestas básicas ou serviços comunitários”, explica o advogado.
“Agora, com o PL, a pena passou para reclusão de 2 a 5 anos, dependendo de cada caso. Não é qualquer tipo de maus-tratos que vai levar para a prisão, dependerá da gravidade e das investigações a respeito da existência de dolo, etc. Mas o importante disso é que, aos poucos, vai se mudando o cenário em relação à garantia dos direitos dos animais”.
Wellington explica que o projeto foi aprovado quase por unanimidade no Senado, recebendo apenas um voto contrário. Como já havia sido anteriormente aprovado na Câmara dos Deputados, agora, com a aprovação também no Senado, o projeto segue para a sanção presidencial. Até que se chegasse à aprovação desse projeto, o advogado aponta que um longo caminho foi percorrido e a expectativa é de que os avanços continuem a ser conquistados.
“Ainda existem outros projetos em Brasília que vão abranger outros animais. Recentemente conseguimos a aprovação do PL que muda a condição do animal de objeto. Agora o PL está na Câmara. De lá, sendo aprovada, vai para passar para a sanção da Presidência da República”.
ARTICULAÇÃO
Vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais da Ordem dos Advogados do Brasil no Pará (OAB-PA), Albeniz Neto também destaca as consequências positivas geradas pela interpretação legislativa que passa a ver os animais como seres que possuem sentimentos, assim como a aprovação da PL que aumenta a pena a quem pratica maus-tratos contra cães e gatos. Para ele, o cenário legislativo atual aponta para uma mudança real na garantia dos direitos dos animais. “Passamos muitos anos estagnados no sentido legislativo. Os anos passavam, os casos aconteciam, as pessoas se indignavam e depois esqueciam, mas de poucos anos para cá estão se observando avanços legislativos, o pensamento em geral está mudando”, considera.
“Foi um trabalho enorme para a causa animal conseguir aprovar o Projeto de Lei 1.095/2019. Foi necessária muita articulação política de toda a causa animal no Brasil porque a punição que temos hoje para quem pratica maus-tratos a animais é muito branda. Considerando os critérios do direito, a pena acaba se transformando em outros tipos de penas e a pessoa nunca chega efetivamente ao encarceramento e a falta da punição faz com que não se alcance um caráter pedagógico”.
PARA ENTENDER
BALANÇO NO PARÁ
No primeiro semestre de 2020, a Polícia Civil por meio da Demapa (Divisão Especializada em Meio Ambiente e Proteção Animal), realizou 185 atendimentos a denúncias de maus-tratos de animais, tendo registrado 20 ocorrências a partir dessas observações, pois a maioria não foi comprovada como crime perante a lei.
SERVIÇO
Denúncias de maus-tratos contra animais podem ser feitas pelo número 181, que funciona 24 horas por dia, ou também pelo telefone da Demapa (3238-1225), em horário comercial.
Expectativa por investigação rigorosa e punição efetiva
Enquanto avanços são observados no âmbito legislativo, o advogado Albeniz Neto lembra que a Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais da OAB-PA continua a receber denúncias de crimes contra animais, e não são poucos. De acordo com ele, dentre os mais comuns estão a manutenção de cães e gatos amarrados em coleiras por longos períodos, ou que são mantidos em quintais sujeitos a sol e chuva, ou mesmo que passam fome por falta de alimentação adequada. “Também recebemos muitas denúncias de abandono, como o caso clássico da caixa com uma ninhada de gatinhos abandonada em uma feira ou em uma praça”, exemplifica. “Para a jurisprudência isso é considerado crime. A lei diz que maltratar animal é crime e essa interpretação já foi verificada pela jurisprudência várias vezes”.
Um exemplo prático de como o abandono de cães e gatos é um tipo de maus-tratos que, infelizmente, ainda é muito comum, está na grande população de animais que acabam acolhidos em abrigos. Somente no ‘Au Family’ vivem, atualmente, 304 cães, seis cavalos, um porco e cerca de 600 gatos. De acordo com a responsável pelo abrigo, Raquel Viana, todos esses animais, sem exceção, foram vítimas de maus-tratos antes de serem acolhidos pela ONG. “100% deles chegaram vítimas de maus-tratos. Para a gente, a aprovação do PL é importante, sem dúvida, porque quando se atua resgatando um animal desses sofrendo maus-tratos é terrível chegar na delegacia e ver que nada é feito”.
Raquel aponta que, na prática, a pessoa que hoje é conduzida à delegacia acusada de praticar maus-tratos contra animais acaba sendo liberada após prestar esclarecimentos. A perspectiva, agora com a aprovação do PL, é que haja mais rigor na investigação contra tais agressores e a efetiva punição contra o crime praticado. “A sensação é de impotência diante da legislação e do poder público. O novo vem agora, mas o novo só virá se também tivermos agentes de segurança pública treinados para tal”, evidencia. “Não adianta termos a lei e os órgãos competentes não estarem preparados. É apenas o primeiro passo porque muita coisa vai ter que mudar para que a lei seja aplicada”.
Fonte: Diário Online