Processo da Reclamação Disciplinar já tramita há mais de nove meses no Conselho. Em novembro do ano passado, procurador fez declaração racista contra indígenas e quilombolas durante atividade com estudantes.
O Conselho Nacional do Ministério Público adiou novamente a continuidade do julgamento do processo de reclamação disciplinar contra o procurador Ricardo Albuquerque, previsto para ser realizado nesta terça-feira (18). Essa é a sexta vez que o julgamento é adiado. O caso começou a ser julgado no dia 10 de março, com voto favorável do relator ao Processo Administrativo Disciplinar, mas foi suspenso após pedido de vista do conselheiro Marcelo Weitzel Rabelo de Souza, na sessão do dia 11 de março.
Procurador do Ministério Público do Pará, Albuquerque é acusado pelo crime de racismo. Em novembro do ano passado, durante uma atividade com estudantes no Ministério Público, o procurador fez declarações racistas contra indígenas e quilombolas ao afirmar que não teria “dívida nenhuma com quilombolas” por que não ele não tinha um navio negreiro e que “problema da escravidão aqui no Brasil foi porque o índio não gosta de trabalhar”. Após a repercussão dos fatos, o Procurador se justificou e argumentou que se tratava apenas de um debate acadêmico e que por sua índole profissional não deveria ser punido.
A reclamação disciplinar foi apresentada no início de dezembro de 2019 pela Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), pela Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Pará (Malungu), pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), e por um conjunto de entidades como a Terra de Direitos e os Coletivos Margarida Alves de Assessoria Popular, Antônia Flor e o Coletivo Jurídico da Conaq Joãozinho de Mangal. As entidades exigiram procedimento administrativo para apurar as faltas disciplinares cometidas pelo Procurador, além da sua responsabilização criminal.
Assessora jurídica da Terra de Direitos e da Conaq, Vercilene Dias avalia que o adiamento pela sexta vez de um processo de racismo que já tramita há 9 meses revela a postura da Justiça nesse tipo de caso. “O Conselho não dá a devida importância que deveria dar a esse tipo de situação, assim como o Sistema de Justiça nunca deu a devida importância às questões raciais e ao discurso de ódio e racista contra povos quilombolas, povos indígenas e minorias no país”, aponta. E reforça: “A gente espera que o CNMP haja no sentido de tentar coibir esse tipo de discurso, principalmente dentro do Sistema de Justiça”.
Em março, a Corregedoria Nacional do Ministério Público decidiu afastar Albuquerque do cargo que ocupava como Ouvidor-geral. Após uma semana, o procurador enviou à Procuradoria Geral da República o pedido de renúncia do cargo.
Nesta terça-feira, 18 movimentos populares e organizações da sociedade civil publicaram uma Carta Pública cobrando a responsabilização do procurador e a aplicação de medidas disciplinares. No documento, as entidades destacam a desigualdade racial no Sistema de Justiça brasileiro (em que mais de 80% dos magistrados e magistradas se declaram brancos) e lembram que o Ministério Público implantou a reserva de vagas para pessoas negras apenas em 2017, três anos após a sanção da lei que estabeleceu a criação de cotas raciais em todas as esferas do poder público.
Fonte: Terra de Direitos