Pará tem 20 municípios “na fila” para se emancipar

Entre autorização para plebiscitos e estudos de viabilidade, o Estado poderia ganhar mais cidades, mas vontades esbarram na legislação atual
Mojuí dos Campos foi o último município criado no Estado do Pará, em 2013 | Silvágner Grigório/Ascom/PMMC

Há quase onze anos, o Pará ganhava seu último município, o de número 144. Mojuí dos Campos, no Baixo Amazonas, teve sua emancipação em 1º de janeiro de 2013, pouco menos de cem anos depois de ter sido fundada por nordestinos, quando era ligada a Santarém. Foi elevada ao status de vila nos anos de 1960 para virar cidade somente na primeira década do século 21.

Como Mojuí, muitos distritos e vilas do Pará almejam essa condição, mas esbarram na burocracia e em outros processos que inviabilizam os anseios de determinados grupos. Naquele mesmo 2013 e também em 2014, o governo federal, à época do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (PT), vetou integralmente dois projetos de lei construídos e aprovados pelo Congresso Nacional que definiam critérios para criação, emancipação e fusão de municípios. A alegação à época, que contava com o apoio do Ministério da Fazenda, era a de possibilidade de criação de despesas insustentáveis para os Estados.

No regramento atual, somente a União pode criar municípios e os municípios podem criar distritos. Para que Estados voltem a ter esta prerrogativa seria necessária uma lei federal – como uma das duas vetadas por Dilma – regulamentando a atuação. Esta lei federal remete à aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de autoria do então deputado federal Cesar Bandeira (PFL-MA) e aprovada em 1996 restringindo as condições de emancipação de distritos.

De lá para cá, só na Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), onde ocorrem as primeiras tramitações legais rumo à emancipação de distritos paraenses, foi autorizada a realização de plebiscitos em onze, de quatro diferentes regiões: Castelo de Sonhos (Altamira); Taboca, Ladeira Vermelha e Sudoeste (São Félix do Xingu); Brejo do Meio, Paraguatins e Rio Preto dos Carajás (Marabá); Vitória da Conquista dos Carajás (Novo Repartimento); Monte Dourado (Almeirim); Lago Grande do Curuai (Santarém); e Fernandes Belo (Viseu).

ESTUDOS

No Diário Oficial do Estado já foram publicados nove estudos de viabilidade para a criação de outras nove cidades: Santa Fé do Rio Preto (Marabá); Cajazeiras e Cruzeiro do Sul (Itupiranga); Lindoeste (São Félix do Xingu); Santana do Capim (Aurora do Pará); Maracajá (Novo Repartimento); Casa de Tábua (Santa Maria das Barreiras); Icoaraci (Belém); e Bela Vista do Caracol (Trairão).

“Se o apoio fosse efetivo, já teríamos mudado essa história”, aponta o presidente da Confederação das Federações Emancipacionistas e Anexionistas do Brasil (Confeab), que engloba o movimento Emancipa Brasil, Antônio Pantoja da Silva, também presidente da Federação das Associações de Desenvolvimento Distrital e Emancipalista do Estado do Pará (Fadepa). Ele é um dos que assina uma carta aberta aos legisladores estaduais de todo o país que participaram da 26ª Conferência da União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais (Unale), realizada em Fortaleza (CE), no início de novembro.

“A EC 15/96 feriu de morte o Pacto Federativo. Esse vacatio legis tem impedido que os Estados organizem seus territórios. A Confeab foi criada para coordenar o processo de criação de municípios no Brasil. Entendemos, porém, que essa luta não deveria ser apenas nossa. Deveria, sim, principalmente, ser das Assembleias Legislativas. A elas caberia a missão institucional de defender os Estados brasileiros que tiveram seu direito usurpado (…)”, diz o documento.

Apesar das dificuldades, o Pará é um estado que já avançou bastante nesse processo emancipacionista. “Conseguimos aqui em Itaituba um plebiscito em favor do distrito de Moraes de Almeida e 94% do eleitorado de todo o município disse ‘sim’ à criação – e olha que são 60 mil eleitores em Itaituba e somente quatro mil em Moraes de Almeida, e mesmo assim, uma maioria foi favorável. O Tribunal Regional Eleitoral homologou esse resultado, mas o Tribunal Superior Eleitoral negou, alegando a falta de lei federal”, lamenta.

Antônio Pantoja considera que o Pará deve seguir o exemplo do que houve no Mato Grosso, que conseguiu a emancipação de distritos via ações junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) nos últimos anos. “O governador Helder Barbalho (MDB) chegou a autorizar que a Procuradoria-Geral do Estado impetrasse Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) junto ao TSE por omissão na situação de Moraes de Almeida, a própria Confaeb tem um mandado de injunção pedindo ao TSE que nos oriente sobre o que fazer, nós não desistimos. Já são 27 anos deste movimento”, reforça.

Pantoja relata que estão na Alepa cerca de 60 pedidos de emancipação de distritos, mas apenas 22 foram objetos de apreciação – um deles foi o de Moraes de Almeida, o outro é de Castelo de Sonhos, que se encontra com uma situação jurídica pendente, pois pede a emancipação visando a inclusão de um outro distrito, o de Cachoeira da Serra, que não quer a desindexação. Até o momento, o TRE do Pará não deu conhecimento a nenhum dos dez pedidos de plebiscitos aprovados no ano passado.

O emancipalista considera uma grande vitória para o movimento a criação, em agosto deste ano e com apoio de cerca de 200 deputados, da Frente Parlamentar Mista de Apoio à Emancipação de Distritos no Brasil, que tem à frente a deputada Flávia Morais (PDT-GO). Os federais da bancada paraense Henderson Pinto, Keniston Braga e Renilce Nicodemos, todos do MDB, integram o grupo de trabalho. Celso Sabino, do União Brasil, também fazia parte, mas deixou a Câmara Baixa do Congresso Nacional para assumir o Ministério do Turismo. O senador Beto Faro (PT-PA) também faz parte da Frente.

“Acho que só não estamos pior que o Amazonas, que conta com somente 62 cidades. Só que a nossa população rural é bem maior que a do estado vizinho. Em Altamira, por exemplo, considerada uma das maiores cidades do mundo em extensão territorial, cabe um Ceará inteiro de 184 municípios e poderia fazer ainda mais uns dez. Com isso a gente vê o quão grave e distorcida é a divisão geopolítica do Pará. O desenvolvimento passa também pelo reordenamento territorial, mas Brasília proibiu que os estados ordenem seus territórios. Temos que chamar Legislativo e Executivo para conversar sobre, nós queremos e precisamos avançar”, finaliza.