Soldada da PM denuncia coronel por ameaça e assédio sexual

A militar chegou a tirar licença, trocar número de telefone, mas nada adiantou
Jessica pensou em desistir da carreira por causa de assediador (Reprodução)

Jessica Paulo do Nascimento, soldada de 28 anos, resolveu quebrar o silêncio e o medo e denunciar um tenente-coronel à Corregedoria da Polícia Militar por assédio sexual e ameaça de estupro e morte. O homem, comandante do Batalhão da Zona Sul de São Paulo, não foi identificado, devido ao sigilo do processo. As investidas, segundo ela, começaram em 2018 e prejudicou a vida e a carreira dela.

Nos autos, muitas mensagens que o comandante enviou a Jessica, com propostas sexuais, ataques e ameaças.

Jessica ingressou na PM em 2013 e, até 2018, ela conta que nunca teve problemas com colegas, seja de que hierarquia fosse. Até que, em 2018, um novo comandante assumiu o Batalhão da Zona Sul de São Paulo.

“Eu trabalhava em uma outra companhia na época, não ficávamos no mesmo local. Só fui conhecê-lo no dia em que ele veio visitar a minha companhia, para se apresentar e conhecer o efetivo”, contou Jessica.

Início “inocente”

Naquele mesmo dia, a vida dela começou a se transformar em um inferno. O assédio começou calmo, com um convite para sair, que ela recusou, disse que era casada.

“Tentei ser educada, expliquei que era casada, tinha filhos, mostrei a minha aliança. Hoje eu vejo como era inocente. Porque, a partir dali, começou a perseguição contra mim. Como eu não cedia e percebi que ele não ia desistir, fui fazer o teste para o Corpo de Bombeiros, queria sair de onde estava. Mas ele me sabotou, não permitiu. E o pior, quando soube que eu queria sair da companhia, exigiu minha transferência para um batalhão que fica a 40 quilômetros da minha casa. Mesmo sabendo que eu tinha dois filhos ainda bebês”, detalha.

Afastamento

Depois de muita insistência do assediador, a soldada contou o fato ao capitão da 1ª Companhia. Ele a orientou a pegar um atestado de 6 meses, para garantir o seu afastamento por instabilidade emocional e ficar longe das investidas do comandante.

“Mas não adiantou. No início de 2019, solicitei uma licença não remunerada de dois anos. Sugeri então ao meu marido que procurássemos um outro lugar para viver. Assim, viemos para a Praia Grande, para onde ele conseguiu se transferir. Mudei meu número de telefone e tudo parecia estar bem”.

Jessica cogitava pedir desligamento da PM assim que a licença não remunerada vencesse, no início de abril deste ano.

Quando pensava em voltar ao serviço e ter que conviver com o assediador, ela passava por crises ansiedade e de pânico.

“Foi quando pedi à secretária dele (do comandante) para que intercedesse por mim no sentido de obter pelo menos uma transferência para o litoral. Eu não queria mais contato com ele. Porém, alguém passou meu número novo para ele. E ele voltou a me ligar e mandar mensagens, sempre com palavreado chulo e propostas indecentes”, diz.

Dando “corda”

Um advogado aconselhou Jessica a reunir mais provas contra o comandante, dando alguma falsa esperança a ele. Ele passou a prometer que iria transferi-la e que iria torná-la farmacêutica da PM (já que ela está cursando faculdade de Farmácia). Mas para isso precisaria se submeter às propostas sexuais dele.

Segundo Jessica, o comandante ameaçava a integridade física dela e da família, caso ela não cedesse.

Ele marcou uma suposta reunião na Sexta-feira Santa, 7 de abril, em São Paulo, para resolver o seu caso. Mas ele planejava mesmo levá-la a um hotel.

Denúncia

Mas, um dia antes da data marcada, Jessica denunciou o caso à Corregedoria da Polícia Militar. Na sexta-feira, dia 7, apesar da insistência do comandante por meio de mensagens de Whatsapp, ela não foi.

“Eu sonhava em poder ajudar as pessoas, em ser reconhecida como uma protetora dos inocentes. Mas era tudo falso. Foi o fim de uma ilusão. Se eu pudesse, de alguma forma, avisar à Jéssica criança, lá no passado, daria dois tapas na cara dela e diria para ela acordar, procurar uma outra profissão”, declarou.

Exemplo

Apesar dos problemas que a profissão lhe trouxe, ao esbarrar na pessoa errada, em cargo superior, no trabalho, a soldada esperar que a Justiça seja feita e os danos provocados, reparados. E que a história dela sirva de exemplo para outras pessoas em situação semelhante.

A Polícia Militar informou ao UOL que recebeu a denúncia e imediatamente instaurou um inquérito policial militar para apurar rigorosamente os fatos.

“O Oficial foi afastado do comando do Batalhão e a investigação é conduzida pela Corregedoria da Polícia Militar. Todos os fatos são sigilosos, conforme prevê a legislação”, concluiu a corporação.

O Liberal, com informações do UOL