Em portaria publicada no Diário Oficial, governo pede que as instituições só usem ensino online de “forma complementar” em momento que a pandemia piora no País
O Ministério da Educação (MEC) publicou nesta quarta-feira portaria no Diário Oficial dizendo que as universidades federais e particulares devem voltar às aulas presenciais a partir de dia 4 de janeiro. As atividades digitais devem apenas ser feitas de “forma complementar” de acordo com a determinação. A medida surge em um momento que o País enfrenta aumento no número de casos e piora da pandemia de coronavírus. Também foi considerada inconstitucional por especialistas.
Na semana passada, o MEC já havia deixado claro que não iria homologar a decisão do Conselho Nacional de Educação (CNE) de permitir as aulas remotas também no ensino básico até dezembro de 2021. A intenção do governo federal, segundo fontes, é a de estimular uma volta presencial das escolas e universidades.
O Estadão apurou também que a intenção do ministro da Educação, Milton Ribeiro, é a de se aproximar cada vez mais do presidente Jair Bolsonaro com medidas consideradas ideológicas. Em live na semana passada com Bolsonaro, Ribeiro disse que o “parecer do MEC é em defesa do ensino presencial”.
O Brasil tem atualmente 8,6 milhões de estudantes no ensino superior e 6,5 deles estão em universidades privadas. Mais de 1 milhão de alunos cursam instituições federais e o restante está em outras públicas, municipais ou estaduais. Essas últimas são as únicas que não estão incluídas na portaria publicada nesta quarta-feira.
“Revela um profundo desconhecimento acerca das realização das atividades presenciais em nossas universidades”, diz o reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Salles, sobre a portaria. Segundo ele, é impossível realizar aulas nos espaços que existem e cumprir protocolos de distancimento social. As mais de 60 universidades, que têm autonomia administrativa e acadêmica, já vem publicando determinações de que as atividades continuariam online no ano que vem, como a federal da Bahia e de Goiás. As instituições demoraram meses para se organizar para aulas online e começaram apenas no segundo semestre.
A Universidade de Brasília (UNB) divulgou nota dizendo que recebeu “com surpresa” a decisão do MEC e que ainda discute como será a volta presencial. “A Universidade de Brasília reitera que não colocará em risco a saúde de sua comunidade. A prioridade, no momento, é frear o contágio pelo vírus e, assim, salvar vidas. A volta de atividades presenciais, quando assim for possível, será feita mediante a análise das evidências científicas, com muito preparo e responsabilidade”, diz a nota.
A Universidade Federal do ABC (UFAB) reiterou sua autonomia e disse que “considerando os dados atuais de contaminação e propagação do coronavírus na região metropolitana de São Paulo, a UFABC permanece com atividades presenciais suspensas” e que não é possível prever data para o início das atividades presenciais.
Mesmo com uma eventual redução no número de casos, secretários de Educação também afirmam que vai ser preciso ao menos usar o ensino híbrido. Justamente porque os protocolos exigem distanciamento nas salas de aula. Para que os alunos fiquem a 1,5 metro um do outro não é possível que todos estejam ao mesmo tempo presencialmente. Não há espaço suficiente na maioria das escolas.
“É inconstitucional e ilegal”, diz a professora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Nina Ranieri. Ela explica que as universidades têm autonomia acadêmica garantida. Além disso, a própria portaria afirma que “no caso de suspensão das atividades letivas presenciais por determinação das autoridades locais”, as instituições de educação superior poderão voltar à forma online. Segundo especialistas, a confusão pode causar judicialização.
Os jovens são considerados os que melhor se adaptam ao ensino online, além de terem mais possibilidade de transmistir o coronavírus. Em vários países do mundo, o ensino superior tem se mantido a distância mesmo quando as escolas retornaram ao presencial.
A portaria diz que “os recursos educacionais digitais, tecnologias de informação e comunicação ou outros meios convencionais deverão ser utilizados de forma complementar, em caráter excepcional, para integralização da carga horária das atividades pedagógicas” e que as instituições vão decidir como serão as provas e o que poderá ir para o digital.
Fonte: Estadão