No Pará coletivo de mulheres indígenas luta por igualdade e empoderamento

Suraras do Tapajós, o coletivo de mulheres indígenas que luta contra o preconceito, racismo, machismo e pela defesa de seus territórios

  Mulheres indígenas vítimas de preconceito étnico, racismo e violência doméstica criaram em Alter do Chão, oeste do estado uma rede de apoio e acolhimento para dar suporte uma as outras. As Suraras do Tapajós promovem o empoderamento e o resgate da autoestima por meio de cursos, música, rodas de conversa com o objetivo de transformar essas mulheres em protagonistas de suas próprias vidas.

Não é fácil ser mulher na sociedade machista e patriarcal que vivemos. Todo dia alguma mulher no mundo morre ou é vítima de assédio, abusos, ameaças e o pior de tudo: Há sempre um homem duvidando ou colocando em cheque a capacidade feminina.  O cenário é ainda mais desesperador quando se fala em mulheres indígenas na Amazônia, que ainda carregam vários estigmas dentro da própria aldeia e são alvos de preconceito étnico, machismo e racismo.

Para combater tais atrocidades, em 2016, na vila de Alter do Chão, no oeste do Pará, mulheres de diversas etnias indígenas se reuniram para criar uma rede de apoio e acolhimento às indígenas vítimas de abuso sexual e violência doméstica. A partir daí nasceu o coletivo Suraras do Tapajós, com a missão de promover e fortalecer o protagonismo, a liderança e os direitos das mulheres indígenas.

Além disso, desenvolver estratégias de combate à violência, racismo e intensificar a luta indígena, que tem seus territórios ameaçados pelo modelo de desenvolvimento predador, que afeta principalmente a ala feminina. As Suraras promovem o empoderamento dessas mulheres e acreditam que a força do canto das mulheres são sagrados como a Terra, uma conexão ancestral que elas carregam no DNA.

Representatividade

“O coletivo surgiu em meio a necessidade de representatividade da mulher indígena em ter lugar de fala no meio em que vivem, é preciso falar sim que existe machismo dentro das aldeias indígenas, existe submissão e isso deve ser combatido. É fundamental que essa geração de mulheres empoderadas possam deixar um legado paras as mais novas, olhando para dentro de si com mais compaixão e orgulho”, destaca a ativista Ellen Aciolli, membro das Suraras do Tapajós.

Na visão das Suraras, todas as mulheres estão vulneráveis à violência. Os locais de fala, os espaços a serem ocupados são negados e isso acontece em maior escala quando se trata da questão indígena. “Existe preconceito, machismo, baixa autoestima, tristeza e uma série de fatores que contribuem para a invisibilidade da mulher indígena”, completa Adelina Borari, que também integra o grupo em Alter do Chão.

Na sede do coletivo são realizadas reuniões e rodas de afetividade entre as mulheres que sofreram algum tipo de abuso e que buscam apoio e acolhimento. Durante as rodas de conversa foi constatado que muitas indígenas sofrem violência (seja em maior ou menor escala).  A situação preocupou a coordenação do grupo e imediatamente agendou uma ida até as aldeias para verificar o que de fato vinha ocorrendo.

As Suraras do Tapajós se tornaram referência na região e conseguiram unir muitas mulheres que estavam em situação de abandono, baixa autoestima e que não tinham voz dentro do seu círculo social. Hoje são desenvolvidos diversas projetos e ações que resgatam a esperança e a fé na vida. Oficinas de artesanato e biojoia, caravanas com ciclo de palestras, workshops, oficinas de sensibilização a respeito de diversos temas. Tudo tem isso tem transformado a vida das mulheres para melhor e varreu para longe as lembranças de opressão do passado.

Música como forma de empoderamento

A arte sempre foi usada como ferramenta de transformação na sociedade e o coletivo mantém um grupo de carimbó formado por mulheres, como forma de expressar o talento e reforçar a luta em prol do respeito e igualdade de gênero.

Mesmo na música, as Suraras ainda tem que enfrentar algumas barreiras. O machismo nosso de cada dia é implacável também no carimbo, que originalmente é um ritmo tocado somente por homens. “A gente já escutou um monte de coisa, falaram que carimbo não é pra mulher, que a gente não sabe tocar bem, que homem toca melhor”, revela Adelina. Mas as Suraras não se intimidam os comentários e seguem levando música e empoderamento pelos quatro cantos de Alter.

As apresentações das Suraras lotam as praças da vila turística. A energia contagia o público que sempre aplaude e pede bis. “Tem menina que quer aprender a tocar o curimbó, rabeca. Legal ver que estamos motivando outras manas a ocuparem locais que são majoritariamente formados por homens, como as bandas de carimbo, por exemplo”, comemora Adelina.

Ausência de dados oficiais dificulta a implementação de políticas públicas

De acordo com as Suraras, o Brasil não possui nenhum dado sistematizado sobre os índices de violência contra a mulher indígena. As informações são dispersas e não compõe nenhuma plataforma, sendo assim, sem estatísticas completas, a criação de políticas públicas para as indígenas ficam inviáveis.

 “Dessa forma não conseguimos dar um suporte maior para elas seja na aldeia ou na cidade, pois as tradições culturais variam conforme as etnias. Tem que haver um estudo abrangente para compreender melhor como ocorre essa violência e de que maneira podemos solucionar”, sugere Acioli.

As terras indígenas localizadas na região do Tapajós, no Pará, convivem com a falta de políticas públicas, violação e apropriação cultural. São mais de 500 famílias formadas, em sua maioria, por mulheres. Mesmo com o papel de chefe dessas famílias, são elas as que mais sofrem com a violência, seja por parte de seus parceiros/companheiros.

Os abusos praticados contra as indígenas vão desde violência psicológica, humilhações devido a cor da pele, tipo físico, violência sexual, entre outros. Vale lembrar ainda, que o preconceito vem de dentro e fora das aldeias, tanto pelos próprios indígenas, quanto por não-índios.

A área do Baixo Amazonas é constituída por 14 povos indígenas (Apiaká, Arapiun, Arara Vermelha, Borari, Cara Preta, Jaraquí, Kumaruara, Munduruku, Maytapu, Sateré Mawé, Tapajó, Tapuia, Tupinambá e Tupaiú)

Créditos das Imagens: Divulgação Suraras do Tapajós/Facebook

Por: Ana Carolina Maia – Jornalista