O solene pontifical romano celebrado na manhã do dia 02 de fevereiro de 2020 na Igreja de São Francisco de Assis, no Caranazal, marcou a instalação da Província Eclesiástica e da Arquidiocese de Santarém e a posse canônica de seu primeiro arcebispo, Dom Irineu Roman, CSJ.
A liturgia foi cantada pelo Coral da Paróquia de Nossa Senhora de Fátima, que empenhou-se ao máximo para dar a devida solenidade e sacralidade para aquela ocasião histórica. Dois experientes pianistas tocaram as obras que lhes foram repassadas pela equipe litúrgica que organizou a cerimônia.
Não fosse o Coral de Fátima, com seus musicistas, quem seria por nós? Estamos numa cidade que já se regozijou com seus excelentes coros de igreja, capazes de executar complexas obras a quatro vozes mistas, regidos, inclusive, por maestros da categoria de Wilson Fonseca e Wilde Fonseca. Atualmente padecemos pela falta de corais que possam fazer resplandecer a beleza salutar da música sacra e do canto gregoriano, sobretudo nas ocasiões mais solenes.
A santa missa em análise iniciou com a consagrada Marcha da Igreja; música pomposa, fundamental para liturgias em que toda a Igreja, com seus pastores, presbitério e povo, exulta e louva a Deus pelos acontecimentos que a engradecem. A Marcha é apropriadíssima para eventos eclesiásticos grandiosos; não poderia ter sido melhor a escolha do introito.
Outro momento marcante do pontifical foi a execução da Ave-Maria, de Franz Schubert, em veneração à Padroeira arquidiocesana. A obra em latim, cantada a plenos pulmões pelas coralistas, conferiu grande sacralidade ao momento e promoveu a contrição das almas diante da imagem da Virgem Imaculada.
Notável também foi a entoação do Veni Creator Spiritus durante a procissão recessional (cortejo final). Este célebre hino gregoriano do século IX nunca deixou de ser ressoado na Igreja nos momentos mais insignes, como nas aberturas de sínodos, conclaves, anos santos, jubileus, congressos eucarísticos, ordenações, elevações eclesiásticas e posses canônicas. A obra veio consolidar o desejo do Sr. Arcebispo de um novo Pentecostes para a Igreja Particular de Santarém.
Todo o cerimonial transcorreu em conformidade com as normatizações constantes na Constituição Sacrosanctum Concilium sobre a sagrada liturgia do Concílio Ecumênico Vaticano II. Em seu n. 114 se pode verificar uma importante recomendação acerca do canto coral na liturgia: “O tesouro que representa a música sacra deve ser conservado e desenvolvido com o maior carinho. Promova-se a formação de coros, especialmente junto às catedrais”.
A CNBB, por sua vez, no documento A música litúrgica no Brasil (Estudos da CNBB 79), publicado em 4 de dezembro de 1998 (nos 35 anos da Sacrossanctum Concilium), afirma o seguinte sobre o coral: “A reforma litúrgica do Vaticano II não aboliu o coral. Pelo contrário, o incentivou. Um coral bem formado e orientado, longe de eliminar o canto da assembleia, pode exercer seu ministério múltiplo: ora dirigindo o povo na oração cantada, alternando ou reforçando o canto litúrgico da assembleia; ora destacando-o com o acréscimo de um arranjo musical; outras vezes cantando ao longo da celebração litúrgica uma obra, cujas exigências musicais requerem e desafiam a sua competência” (n. 253).
Mais adiante, no supracitado documento, asseveram os Bispos do Brasil: “O coral desempenha verdadeiro ministério ou função litúrgica na assembleia celebrante e por isso é importante para uma celebração viva na liturgia renovada. A sua atuação redunda em benefício da própria comunidade, principalmente pela valorização da liturgia cantada, que deve ser o modelo das demais celebrações, e pelo auxílio que presta à participação do povo” (n. 254).
Em relação à língua latina (Ave-Maria e Veni Creator), determinou o Concílio Vaticano II: “Conserve-se o latim nos ritos latinos, salvo exceção de direito” (SC, 36, § 1). “Não se abandone, porém, completamente a recitação ou o canto em latim das partes do ordinário da missa que competem aos fiéis” (SC, 54).
Quanto ao gregoriano (Veni Creator), ensina o Vaticano II: “A Igreja reconhece o canto gregoriano como próprio da liturgia romana. Por isso, na ação litúrgica, tem, indiscutivelmente, prioridade sobre todos os outros” (SC, 116).
No que concerne à execução dos cantos, os instrumentistas do Coral de Fátima optaram pela predominância do piano, embora pudessem ter utilizado a sonoridade ímpar do órgão de tubos, no que também estariam plenamente amparados pela autoridade do Concílio Vaticano II, que assim dispõe: “O órgão de tubos ocupa lugar de destaque na Igreja latina, como instrumento musical tradicional, cujo som dá um brilho particular às cerimônias da Igreja e ajuda a mente a se elevar a Deus” (SC, 120).
O simples fato de não terem cedido ao eletrorritmo no modus executandi já foi de grande valia, posto que tal opção retiraria todo o caráter solene exigido para a memorável circunstância. O eletrorritmo dá uma feição vulgarizada para as liturgias, não sendo possível distinguir a sacralidade de um templo da secularidade dos demais ambientes.
A solene liturgia em comento foi entregue, sem dúvida, nas mãos da única schola cantorum que na atualidade tinha condições de executá-la com as exigências esperadas para o dia inolvidável. O Coral de Fátima reafirmou sua importância para a igreja local e chamou atenção para a necessidade de se ouvir a voz conciliar no que tange à valorização dos corais.
Depois de já ter cantado liturgias memoráveis, como a ordenação de diáconos, padres e bispo (Dom Gilberto Pastana), acolhida e exéquias de bispo, jubileus eclesiásticos, dias festivos de padroeiros a convite de paróquias e comunidades, além das festas e solenidades celebradas com grande júbilo na própria Paróquia de Nossa Senhora de Fátima, o festejado Coral inscreveu novamente seu nome na história eclesiástica ao cantar, com grande beleza, o pontifical de instalação da Arquidiocese de Santarém.
Vida longa aos coristas! Sancta Cæcilia, ora pro nobis. |
Por: Renisson Luís Vasconcelos